O evento que foi um sarro da clínica médica


Em certa ocasião no ano de 2018, o CEO de uma empresa por onde Eu havia apresentado a Clinnet me chamou para participar de um evento exclusivo. Nesse evento estaria sendo promovida a primeira feira para o ramo de Clínica Médica no Brasil. Objetivo dessa feira era criar um paralelo em contrapartida com a Feira Hospitalar. O nome do evento se chamou SAHE 2019 (South America Health Education).

Após algumas reuniões para apresentação da proposta desse evento, networking com CEO de outras empresas convidadas como a Clinnet, jantares e Power Point. A Clinnet entre outras empresas convidadas estariam fazendo parte de uma palestra de soluções para o mercado corporativo de clínica médica no dia da inauguração do evento.

Chegando ao grande dia de inauguração do evento, faço questão de chegar cedo. Ao adentrar a Feira vejo o estande da famigerada MV Sistemas. E logo penso... “- Isso não era para ser uma feira para empresas de clínica médica?”

Andando mais um pouco vejo o estande da Philips, representante do software de gestão hospitalar Tasy, em seguida vejo a Pixeon vendendo o seu software especialista de Pacs, na medida em que vou andando vejo apenas empresas do ramo Hospitalar. Parecia uma Mini Feira Hospitalar. Nesse momento achei um pouco de graça. O mercado de Clínica Médica parece que inexiste. Não consegue obter credibilidade para um evento com expositores de empresas do seu segmento. Ah... Eu não podia esquecer. Havia uma empresa de software do ramo de Clínica Médica chamada Medplus. O estande deles estava ao lado da porta do banheiro.

Muito bem... passado as primeiras impressões, começa o evento, com diversas palestras simultâneas. Em nossa arena de palestras, tínhamos no grupo uma turma bem multidisciplinar.

Entre os meus colegas, me lembro de um médico que apresentou a sua empresa de reembolso médico. Ele se especializou no tema, realizando o processo de reembolso de suas próprias cirurgias. Se tornou autoridade no assunto e foi convidado para apresentar o seu serviço. Diante da escassez de credenciamento, ou melhor, de credenciamento de qualidade, as clínica voltaram a utilizar a modalidade de reembolso para atendimento.

Depois vieram falar de Compliance. O que as clínicas ou médicos entendem de Compliance? Absolutamente nada. A grande maioria delas não possui coordenação, software de gestão e qualificação profissional. Vamos ignorar o tema, para não tornarmos esse texto entediante.

Em seguida veio a CEO de uma clínica médica da cidade de Manaus. Ela iniciou o seu negócio com 2 médicas, que nos primeiros meses abandonaram a sociedade. Ela conta que a clínica continuou e prosperou com muita força de vontade, focando no negócio e nos “números”. Realmente gerir uma clínica médica é um grande desafio. Porém terminada apresentação dessa CEO, descobri que ela não possuía experiência prévia em gestão de clínica médica e nem software ou modelo de gestão de clínica médica em sua empresa. Oras pessoal... se você deseja empreender, e por exemplo, escolhe o ramo de confeitaria, esperamos que se tenha algum entendimento formal ou prático para cozinhar um bolo. Ainda seguindo essa analogia, se pensamos em abrir um centro automotivo, devemos ter ao menos uma afinidade com carros, preferência que entendamos de manutenção preventiva de carros. Fico imaginando porque as sócias desistiram.

Depois falaram do tema mais desgastado do mercado. Saúde humanizada. Tem como realizar um atendimento sem humanização? Isso deveria ser básico né? Não deveria ser uma propaganda de algo especial, além desse assunto já se encontrar super clichê nos hospitais.

Depois dessa foi piorando o nível das apresentações...

Tivemos na época o CEO da empresa Boa Consulta. Uma empresa de software que nasceu com um serviço para clínica médica, sem nunca entender o ramo de clínica médica. Muito comum entre as empresas de Startup. Nascem com uma idéia e um investidor. Um sonho de verão. Boa Consulta oferece para clínica médica, atrair pacientes qualificados em troca de um comissionamento pela indicação. Eu recomendo o serviço para alguns tipos de empresa. A empresa Boa Consulta traz para clínica médica um paciente que possivelmente nunca estaria em seu roadmap. Seu único ponto falho era a falta de integração com os demais softwares de gestão do mercado de clínica médica. Na verdade, não era apenas falta de integração, existia falta de interesse do seu antigo CEO. Bem, a empresa faliu, e foi comprada por um grupo de software do segmento da saúde. Não preciso explicar o motivo pelo qual a empresa foi vendida não é mesmo?

E para minha surpresa, o palestrante seguinte é um médico do Hospital Beneficência Portuguesa. O tema da sua palestra é... Interoperabildiade. Parecia piada né? Interoperabilidade é a capacidade de integração e funcionamento de diversos sistemas em conjunto. Eu quase chamei o CEO da empresa Boa Consulta para participar do debate naquela palestra. O destino prega cada peça. Bem... deixamos o excelentíssimo médico do Hospital Beneficência Portuguesa falar da importância da integração entre sistemas. É quase uma utopia esse assunto. A maioria das empresas de software rejeita a possibilidade de integrações, pois elas entendem que podem expor a sua inteligência de negócio durante o processo de integração com terceiros. Em determinados contextos isso pode fazer sentido, mas a Clinnet não enxerga dessa forma. Clinnet é um software de clínica médica que foi constituído da experiência de 21 anos trabalhando na gestão dessas empresas.

E não podíamos esquecer da Clinnet... nosso tema foi Profissionalização da Clínica Médica.

A nossa apresentação começou falando o seguinte;

33% do quadro societário das clínicas abertas nos últimos 5 anos (ano base 2019) na região metropolitana da cidade de São Paulo, não tinham em seu quadro societário profissionais com formação na área médica ou na área de saúde. O que tornavam esses empresários pouco preparados para gerir o seu negócio. Adiante nós temos do outro lado, os profissionais que são médicos, que possuem afinidade com o negócio, mas que se dedicavam a profissão e também não tinham experiência, tempo ou qualificação empresarial para gerir o seu próprio negócio.

Continuando...

33% das empresas de clínica médica, não possuem atividades de controladoria do seu faturamento.

66% das empresas de clínica médica não possuem atividades de controladoria das contas a receber.

Em resumo, como uma empresa que não tem controle da cobrança e do seu recebimento possui estabilidade, perenidade do negócio.

Ao chegar nesse ponto e analisar as pessoas que me assistiam, percebi um sentimento de indignação. Qual o motivo?

Eles faziam parte exatamente dessa estatística alarmante. A verdade dói..., e geralmente não é bem aceita. Encerrei antecipadamente minha apresentação, a possibilidade de qualquer participação nesse evento que se dizia pertencer ao ramo de clínica médica, e que não tem nada haver com a Clinnet.